Páginas

sexta-feira, 5 de maio de 2006

De Maringá pra Vila de Rei

Portugal sofre de, pelo menos, dois grandes flagelos demográficos: uma drástica diminuição da natalidade, com um substancial aumento da esperança média de vida, e a desertificação humana do interior. isso faz com que zonas inteiras da faixa leste do país estejam reduzidas a dúzias de velhos solitários, artificialmente arrebanhados em Lares da Terceira Idade, a que se dá, por vezes, nomes que seriam cómicos se não fossem cruéis. a uma dessas casas botaram o nome de "Última Morada", a outra "Eterno Paraíso", e outras ainda afinam pela mesma espécie de bom-gosto. juntando a tudo isso, vem o verão todos os anos levar o que sobra de uma antiga floresta nacional, alargando os horizontes num sem-fim de milhares e milhares de figuras esguias e ressequidas de árvores queimadas. não é um problema especificamente português. o que será especificamente português é essa divisão do país em Litoral e Interior, essa desertificação que assola a zona mais próxima dos centros de decisão da União Europeia, a região que poderia, teoricamente, atrair população, quadros, dinheiro, investimento, a faixa do território que mais poderia beneficiar da integração de Portugal na União. mas não é assim. quanto mais longe de Bruxelas, de Estrasburgo ou de Paris, melhor é Portugal - ou pelo menos assim julgamos nós. é um Estado-Membro ao contrário. é como se na América as regiões de um Estado fossem tão mais desenvolvidas quanto mais afastadas de Washington ou de Nova Iorque. Portugal olha para a Europa, a que pertence, às curvas, através do mar e do ar. por terra, o histórico peso da Meseta impede os portugueses de ver e de entender a União em linha reta. tudo o que tenha de passar pela Meseta faz tremer o peito.
vem isto a propósito de um fenómeno singular que está atraindo as atenções para Vila de Rei.
aquela vilinha pequena do distrito de Castelo Branco, na chamada zona d' "O Pinhal", tem a particularidade de ser a povoação que fica no centro geográfico de Portugal, bem perto do Alto de Milriça - o centro geodésico do país. e padece do outro mal que desertifica o interior: a emigração, que leva os poucos jovens que a terra inda produz. vêm à ideia os versos de Rosalia:

"iste parte e aquel parte
e todos todos se ván,
Galiza sen homes quedas
que te poidan traballar"...

pois teve o município de Vila de Rei uma ideia original: chamar gente do Brasil para repovoar o concelho.
chegaram as primeiras quatro famílias inteirinhas, de Maringá, Estado do Paraná, oito adultos e seis crianças.
Portugal tem 500 000 imigrantes, na sua maioria eslavos ou africanos, que, aliás, preferem os grandes centros litorais. mas chamar gente do Brasil, e para o interior, tem um gostinho especial e refresca a língua. inverte os caminhos da História e, quem sabe, um dia refrescará também a toponímia

(...veja o que acontece......quatro meses depois...)

16 comentários:

  1. Caro Jose Cunha, é sempre um grande prazer ler seus posts aqui.
    São informações que, como disse o Jo Lorib só mesmo em blogs.
    Essa de Maringá, quem diria...

    ResponderExcluir
  2. obrigado
    mas agora sou eu que pergunto: o que significa "Maringá"? não encontrei melhor explicação que dizerem que é o nome de uma canção. será?
    aquele abraço desde Coimbra

    ResponderExcluir
  3. Maringá significa Maria do Ingá (ou Ingazeiro), era o nome de uma canção nordestina ,popular nos anos quarenta (Maringá,Maringá,depois que tu partiste,tudo aqui ficou tão triste,eu garrei a imaginar...sic)e virou nome de uma cidade no interior do Paraná com grande número de descendentes de portugueses.
    Muitos paises da Europa tem esse problema de envelhecimento e migração,e Portugal não é o que o resolve melhor.Aqui em S.Paulo convivemos com originários de diversos paises, que veem nos descendentes uma fonte de vigor que tratam com carinho.Filhos de italianos,espanhois,alemaes e franceses tem uma atenção que os filhos de portugueses nem imaginam existir.Minha própria filha mora na Europa com documento italiano(por parte da mãe)pq o consulado vosso não da (ou demora muito) documentos que são direito dela.
    Poe isso eu vejo com bons olhos a decisão de Vila de Rei,uma iniciativa que podia ser ampliada.

    ResponderExcluir
  4. é claro.
    quanto a "Maria do Ingá", muito obrigado. vejam só as voltas que a toponímia dá...
    aquele abraço

    ResponderExcluir
  5. Matou a charada, Jo.Parabéns.

    ResponderExcluir
  6. A propósito de 'Maringá'fui olhar na Wikipédia, e achei o compositor, médico como o sr. e que estudou nos Beneditinos em S.Paulo como eu, embora com muitos anos de diferença.
    http://pt.wikipedia.org/wiki/Joubert_de_Carvalho
    Conhece outro caso de uma música dar nome a uma cidade ?

    ResponderExcluir
  7. música ou canção dar nome a uma cidade é caso único, julgo eu. mas...e por que não? e "Mar'Ingá", "Maringá" é um nome bem bonito.
    e você explicou cabalmente como foi que aconteceu. eu apenas sabia que estava relacionado com uma canção.
    um abraço desde Coimbra para São Paulo

    ResponderExcluir
  8. Anônimo10:13 PM

    Para todos os viajantes com ou sem mala posta, e para todos os demais interessados em conhecer melhor a vida e obra de Joubert de Carvalho, com a "cidade-canção" "Maringá" incluída, aconselho uma viagem até:

    www.dicionariompb.com.br

    Cumprimentos
    Penetra

    ResponderExcluir
  9. essa penetração não vai muito fundo.
    o dicionário de MPB tem mesmo alguma coisa sobre Joubert de Carvalho e sobre "Maringá"?
    se tem, aqui não chegou...
    prefiro a dica de Jolorib

    ResponderExcluir
  10. Anônimo10:33 AM

    Desta vez vou ter de fazer de "guia turítico" para uma penetração q.b.:

    Acesse o portal do Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira que já indiquei;

    No campo em branco que está por debaixo de "Busca por..." introduza o nome Joubert de Carvalho;

    Obterá como resultado da busca - Joubert de Carvalho - Joubert Gontijo de Carvalho.

    Obs.: a penetração também poderá ser feita utilizando o alfabeto que consta na página inicial.

    Boa viagem

    Penetra

    ResponderExcluir
  11. Anônimo10:39 AM

    Eu queria dizer "guia turístico".

    Penetre sempre.

    Penetra

    ResponderExcluir
  12. penetrei,está penetrado.
    obrigado pela dica.
    até breve.

    n.b. estou de mala posta para o Canadá,em trabalho.

    ResponderExcluir
  13. Desculpe penetrar nessa conversa, mas apreciei demais a notícia e pretendo roubar essa goiaba reluzente para a Bacia.

    A propósito, informa-me Houaiss que Maringá é adjetivo de dois gêneros, acrescenta desnecessariamente que é regionalismo do Brasil e sustenta que quer dizer: cujo pêlo é claro, salpicado de negro (diz-se de bovídeo ou caprino).

    A informação etimológica: de "origem obscura".

    ResponderExcluir
  14. moral da estória, a gente não se pode fiar nem no Houaiss...
    aquele abraço

    ResponderExcluir
  15. Anônimo12:19 AM

    sou fisioterapeuta aqui do brasil(bauru s.p.) e gostaria de saber se seria bem recebido para trabalhar com os idosos de vila de reis ai em portugal. sou tambem descendente de portugueses.

    ResponderExcluir
  16. honestamente:
    Portugal tem lugares muito mais interessantes para receber gente que vem do Brasil.

    ResponderExcluir