quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Góis

Góis é uma vila do distrito de Coimbra, entre a Lousã e Arganil. há, porém, outras "Góis" na toponímia portuguesa, a maior parte das quais, se não todas, derivadas, referidas ou transpostas deste topónimo beirão. o mesmo se passa com as Góis existentes no Brasil.
o seu nome aponta para uma muito remota antiguidade.
há quem queira ver neste topónimo uma derivação do gótico "gauja": "o habitante de um pagus ou aldeia; aldeão". nesse caso, não se compreende a lógica de chamar a uma aldeia o nome que designa os seus habitantes. seria como querer chamar-lhe "A dos Aldeões", ou "A dos Vizinhos".
mais sentido faz a explicação do topónimo pela sua derivação basca ou ibera, que persiste na toponímia e na onomástica euskera, como em Goikoetxea / Goyeche / Goieche ("casa cimeira"). e nesse caso, ficaria atestada a antiguidade da povoação, que remontaria aos primórdios do povoamento peninsular. "goiko" significa "alto", "superior", "que está em cima".
e esta é uma constante toponímica, que se repete sob diversas formas, origens e evoluções linguísticas, como em Altinho, Cumeira, Outeiro, Pinheiro, Pinho, Sobral, Sobreira, Sobreposta, Susã.






quinta-feira, 14 de novembro de 2013

o Abade nem sempre é padre

por muito estranho que hoje pareça, "Abade" em toponímia é um hidrónimo.
surge na toponímia galego-portuguesa sob as variantes dialetais Ba, Bade e Vade , sendo que o "Vade" português deverá ser uma hipercorreção de origem erudita em lugar de "Bade". pode, porém, haver contributos linguísticos muito diversos para resultados idênticos. no atual euskera "ibai" significa "ribeira". tem origem num anterior "bai", não sei se o mesmo que o "Bad". há quem veja esta raiz nos topónimos "Baião" e "Baiona".
não contente com ser um hidrónimo, cujo significado é o mesmo que "ribeiro" ou "córrego" ou "regueiro", Abade aparece em formas compostas de cariz pleonástico, como Ribeira do Abade, ou associado a palavras que indicam a natureza do "abade", como "Vale de Abade". o hidrónimo pleonástico "Abade de Neiva" é interessante pela presença de duas designações de "ribeiro" em línguas diferentes, sendo "Abade" pré-céltico e "Neiva", o mesmo que "Navia", um vocábulo celta.

exemplos de topónimos com "Abade":

Abad ou Abade (Gz.)
Abade

Abade de Neiva - um pleonasmo, já que "Neiva" é o nome de um ribeiro que quer dizer exatamente "ribeiro, rio" (Inquirições de 1220 e 1250: "Abbade"). 

Abades - um plural que é uma espécie de "gato escondido com o rabo de fora", uma vez que não é comum haver mais que um abade na mesma abadia.

Abadia - como em "Senhora da Abadia". na Senhora da Abadia, Santa Maria de Bouro, Amares, corre o rio Nava (célt.=ribeiro, manancial), penso que esta "abadia" se refere ao ribeiro e não à Abadia de Bouro, pois que esta é posterior ao culto da "Senhora".

Abadias - plural que constitui mais um "gato escondido com o rabo de fora". à letra: "lugar onde correm regueiros ou regatos".

A Braña (ou Branha) da Fonte de Abade (Gz.)
A Devesa de Bade (Gz.)
A do Abade (Gz.)
A Fonte de Abade de Abaixo (Gz.)
A Lama do Abade (Gz.)
Bade (Gz.)
Cachoeira do Abade (Br.)
Campo de Abade
Casal do Abade
Dabades
Fonte do Abade
Ponte do Abade
Portela do Vade
Ribeira de Abade
Ribeira de Abadia
Souto de Abade
Vade
Vale do Abade
Veiga de Abade (Gz.)
Vinha de Abades

nota: em geral, no Brasil, o topónimo "Abade" não tem esta etimologia ancestral. refere-se efetivamente a alguém que fez parte da estrutura eclesiástica, como "São Bento Abade", "São Pedro Abade", "Vila Santo Antônio Abade". já a "Cachoeira do Abade" não sei se não terá um "abade" galego-português.

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

120 000 visualizações.

hoje o Toponímia Galego-Portuguesa e Brasileira atingiu as 120 000 visualizações. isto apesar de o ritmo de publicação ter abrandado. é sem dúvida um estímulo a que continue e se aprofunde. obrigado a todos.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Picha

os habitantes desta aldeia do concelho de Pedrógão Grande, distrito de Leiria, divertem-se com o sentido brejeiro que pode ter a palavra que dá nome à sua terra. e, tanto quanto sei, já perderam a memória do seu significado original, o qual, assim o julgo, é claro como água.
de acordo com o Dicionário Estraviz, que nos é comum a portugueses e galegos, significa "órgão genital masculino" (fam.), é certo, mas também "fonte pequena que deita água". de facto, é possível que o nome da terra derive do segundo significado. a palavra "picha" tem, nesta aceção, as paralelas "picho" e "pichel", ambas associadas à ideia de água ou dispositivos que a recolham ou por onde ela escorre. ainda desta família, existe o "picheleiro", palavra do Norte de Portugal e da Galiza que designa aquele que faz recipientes de lata ou de estanho para água ou vinho. existe ainda a "picheira", que será o mesmo que "pichel", vasilha para tirar vinho das pipas ou caneca ou infusa de onde se bebe ou se tira o vinho para os copos.
fica também claro que "picha", no sentido brejeiro da palavra, está mais associada à ideia de órgão por onde sai a urina (a "água") do que, propriamente, ao sentido de órgão sexual.
Deste modo não se estranhe que as duas conotações se juntem frequentemente. é o caso do Manneken Pis, em Bruxelas.
em Lisboa há o "Jardim das Pichas Murchas", cujo significado é, agora, óbvio: "jardim das bicas (ou fontes) secas".

domingo, 28 de julho de 2013

recordações do tempo dos castros


a toponímia conserva a recordação de lugares antigamente povoados, pertencentes à chamada "cultura castreja". alguns dos nomes fazem referência ao caráter sagrado do lugar (Cabeça Santa, Monsanto), outros ao númen divino que os protegia (Santa Luzia, Santa Tecla, Senhora da Cola, Santo Ovídio, São Miguel), outros à sua dimensão (Castelinho, Castro Maior) e outros ainda à sua antiguidade (Castro Verde).

mais resumidamente, já me referi a este tema numa postagem de 31 de agosto de 2006.


aqui vão alguns topónimos, que irei acrescentando à medida que me ocorram:

Alto da Cividade
Alto do Circo
Cabeça Santa
Cabeço Cercado
Cabeço dos Mouros
Castelejo
Castelinho
Castelo
Castelo de Paiva
Castelo dos Mouros
Castelo Rodrigo
Castêlo
Castêlo da Maia
Castelucho
Castendo
Castragosa
Castralhouço
Castrelo (Pt. e Gz.)
Castrelo do Val (Gz.)
Castrelos
Castrilhão
Castro (Pt. e Gz.)
Castro da Cidá (Gz.)
Castro d' Aire
Castro da Ponte
Castro de Avelãs
Castro de Barrega
Castro de Cabras
Castro de Lagarelhos
Castro de Ourilhe
Castro de Ovil

Castro de São Paio – recordação do númen padroeiro do castro (cristianizado)

Castro do Rei (Gz.)
Castro dos Mouros
Castro Mau
Castro Pedroso
Castro Laboreiro
Castro Maior
Castro Marim
Castromau – variante "Castromao" (Gz.)
Castromil (Pt. e Gz.)
Castroverde (Gz.)
Castro Verde
Cerca dos Mouros
Cidade Velha
Cividade
Círculo
Citânia
Coroa
Coroas
Coronado
Crasto

Crestuma – de "castro do Úmia ou Uima", o ribeiro que lá passa.

Cristelo
Cristelos
Monforte
Monforte de Lemos (Gz.)
Monsanto
Monte Castelo – pronúncia "Monte Castêlo"
Monte Castro
Monte Crasto
Monte da Saia

Monte de São Félix  –  recordação do númen padroeiro do castro (cristianizado)

Monte Mozinho – pronúncia "Monte Mòzinho"
Monte Murado

Os Castros (Pt. e Gz.)
Outeiro Maior
Penalba (Gz.)
Penalva d' Alva
Penalva do Castelo

Pena Mourisca

Santa Luzia  – recordação do númen feminino padroeiro do castro (cristianizado)

Santa Tecla  – recordação do númen feminino padroeiro do castro (cristianizado)

Santo Ovídio – recordação do númen padroeiro do castro (cristianizado)

São Miguel-o-Anjo  – recordação do númen alado padroeiro do castro (cristianizado)

Senhora da Cola – recordação do númen feminino padroeiro do castro

Senhora do Círculo – recordação do númen feminino padroeiro do castro

Senhoras do Monte – recordação de uma trindade feminina que protegia o lugar

Terronha
Terronhas

Trá-lo-Crasto – "lugar que fica por detrás do castro", designação que se infere ter sido dada por povo do lado contrário


nota: aceito contributos para esta lista. obrigado.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

topónimo "Pessegueiro" e derivados: mais uma vez a pseudo-Fitotoponímia

o topónimo "Pessegueiro" é mais um daqueles habitualmente associados à ideia de Fitotoponímia, isto é, à noção de que se referirá ao nome de uma árvore ou às caraterísticas específicas da flora local. há quem se tenha apercebido das dificuldades levantadas por este topónimo, e em especial dos seus derivados e variantes como "Pexegueiro", Pexeiros, Pixeiros", etc., etc., e, acima de tudo, pela sua relação com a água (Ilha do Pessegueiro, Rio Pessegueiro, Rio Pexegueiro). daí que tenha sido associado à ideia de abundância de peixes. e, claro, daí a atribuir-se-lhe uma etimologia em "piscis" vai o passo de um pardal. mas peixes é o que mares e rios têm mais e nada faz crer que os locais chamados "Pessegueiro", ou seus derivados e variantes, tenham uma especial abundância em peixe que seja razão para o nome que têm. mais complicado, ainda, é o facto de estes topónimos terem formas anteriores em "Peshigeiro" e "Pecegueiro". 
assim sendo, teremos que ir por outros caminhos. que, pelo menos, tenham mais lógica e plausibilidade.

outra coisa que os rios têm junto às povoações, para lá da carência ou abundância em peixe, é a maior ou menor possibilidade de serem atravessados a pé, a nado, de barco ou por cima de pontes. o que, em cada caso, merece a respetiva e adequada toponímia (Coiço, Couce, Couço, Vau, Barca, Barco, Ponte, etc.). e aí, indo pelo latim, mas por "pes/pedis (pé) e siccum/sicci (seco) ou ainda "sequor" (dirigir-se para, ir em direção a), sempre a coisa distingue melhor um local ou um rio dos restantes da mesma espécie. 
estou, portanto, em crer que estes topónimos se referem a lugares onde é possível a passagem sobre as águas ou a águas que permitem que lhes passem a pé por cima.

Topónimos "Pessegueiro", derivados e variantes:

Ilha do Pessegueiro
Monte do Pessegueiro
Pessegueira (Gz.)
Pessegueiro (Pt. e Gz.)
Pessegueiro de Baixo - era "Peshigeiro" no séc. XVIII
Pessegueiro de Cima
Pessegueiro do Vouga - já foi "Pecegueiro"
Pexegueiro (Gz.)
Pexegueiros (Gz.)
Pexeiroos (Gz.)
Pexeiros (Gz.)
Pixeiros (Gz.)
Rio Pessegueiro
São João da Pesqueira (?)


quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Alavandeira, Lavandeira

os topónimos "Alavandeira" e "Lavandeira" aparecem na Galiza e no Norte e Centro de Portugal, sempre associados à presença de um pequeno ribeiro. são, por conseguinte, hidrónimos. a sua raiz "lav-" é a mesma de "lavar", pressupondo a ideia de "água corrente". 

Pinhel, Espinhel

estes dois topónimos referem-se a localidades situadas em lugar que sobressai por ser mais elevado que os lugares em volta. derivam de "pino", ou "pinho", e "espinho", constituindo diminutivos com pronúncia galego-portuguesa meridional (moçarábica). um pouco mais nortenhos e seriam "pinhelo" ou, mais tarde,  "pinheirinho" e "espinhelo". 

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Cubo

o topónimo "Cubo" é relativamente raro e encontra-se sobretudo na Galiza e no Norte e Centro de Portugal. pode ser uma construção em forma de cubo, habitualmente de pedra, ou uma pequena torre. e a sua função é funerária. representa o túmulo de alguém suficientemente importante na época para justificar o trabalho da sua construção.